"Escarafunchando
o que está por traz dos grandes discursos que se arvoram defender a democracia.
Este é o Galeano em sua mais alta forma.
Eduardo
Galeano, num congresso na Itália em 2004, analisa com grande lucidez algumas
questões do mundo actual. Galeano, mostra-nos de uma forma extremamente
simples, a hipocrisia da falsa democracia em que vivemos.
Estas
observações de Eduardo Galeano, são muito interessantes:
"Eu
simplesmente conto as coisas que vejo e que escuto.
Por exemplo,
outro dia escutei um cozinheiro que reuniu as aves: as galinhas, os gansos, os
pavões, os faisões e os patos. E eu escutei um pouco o que o cozinheiro dizia
para elas."
Achei
interessante e gostaria de lhes contar o que escutei."
"O
cozinheiro perguntava com que molho elas queriam ser comidas.
Uma das aves, uma humilde galinha disse: "Nós não queremos ser comidas de maneira nenhuma."
Uma das aves, uma humilde galinha disse: "Nós não queremos ser comidas de maneira nenhuma."
O cozinheiro
esclareceu: "Isso está fora de questão."
Esta
ilustração muito interessante, é uma excelente alegoria do mundo actual, da
forma como está organizado. Esta falsa democracia em que vivemos, dá-nos o
direito de escolher a forma como nos vão explorar.
Continua
Eduardo Galeano dizendo: "Eu achei esta reunião muito interessante
porque é uma metáfora do mundo.
O mundo está
organizado de uma forma tal que temos o direito de escolher o molho com que
seremos comidos."
Dizem que é
um mundo democrático, mas pergunto-me até que ponto é democrático um mundo onde
a soberania se converteu, a soberania dos países foi convertida num objecto de
museu.
Por exemplo
para citar exemplos concretos que me parecem úteis trazer.
O organismo
que governa os governos no mundo de hoje, o Fundo Monetário Internacional está
dirigido por cinco países e dá as ordens a quase todos os os países
do mundo, salvo os países que dão as ordens, claro que podem ser sádicos,
mas não são masoquistas.
O Banco
mundial é mais democrático, é preciso reconhecer e fazer notar essa diferença.
O Fundo
Monetário é dirigido por cinco países, e o Banco Mundial por oito. Depois
temos a organização mundial do comércio, em cujos estatutos se estabelece que
as decisões serão tomadas por voto democrático.
Nunca se
votou na Organização Mundial do Comércio.
Nunca! Nem
uma única vez. Utiliza-se o princípio Estalinista da aclamação.
As decisões
são decididas por aclamação. O organismo anterior que se chamava GATT, votou
uma vez.
Não foi uma
boa experiência, não se repetiu. Nunca se repetiu.
Podemos
falar de um mundo democraticamente organizado quando o mundo depende de três
organismos não democráticos que tomam as decisões no lugar da humanidade?
E o Concelho
de Segurança das Nações Unidas... actualmente, parece que as guerras são
legitimas quando aprovadas pelo Concelho de Segurança da O.N.U. e ilegítimas quando
não as aprova. Mas quem promove esta bênção?
As Nações
Unidas são formadas por uma Assembleia Geral. Aí, estão todos os países, todas
as vozes, inclusive a deste senhor que também quer participar. Mas é simbólica,
a Assembleia Geral é simbólica.
Formula
recomendações, não toma decisões.
As decisões
são tomadas pelo Concelho de Segurança. O Concelho de Segurança é onde mandam
os cinco países que têm direito de veto, e o direito de veto é o que decide.
Eles velam
pela paz mundial. Velam pela paz mundial, mas são também os cinco principais
fabricantes e vendedores mundiais de armamento.... Estados Unidos, Inglaterra,
França, Rússia e China.
Os cinco
fabricantes mundiais e armas, são os encarregados de manter a nossa paz no mundo.
Assim
andamos nós: fazem o negócio da guerra, mas vendem também a paz. Onde? Como? Através
sobretudo, meios de comunicação que reproduzem o sistema de poder no mundo e
avaliam a democracia de cada país, são grandes meios de comunicação que
confundem a liberdade de expressão com a liberdade de pressão e que foram
definidos com mestria por algum anónimo: mijam-nos em cima, e os jornais dizem
que é chuva. O caso mais claro, mais escandaloso de manipulação da opinião
pública mundial é actualmente o caso da Venezuela.
No teatro,
no grande teatro do bem e do mal, há uma distribuição de funções entre os anjos
e demónios, e Hugo Chavez é um dos principais demónios, é um ditador do ponto
de vista das fábricas de opinião pública mundial.
Hugo Chavez
é um ditador, é um estranho ditador. Ganhou oito eleições em cinco anos e
agora, recentemente, no referendum, foi o primeiro presidente na história da
humanidade que colocou o seu cargo à disposição das pessoas e ganhou por 6 a 4, 60% contra 40%, numas eleições que eu
assisti como observador e posso garantir, dar testemunho de que foram
eleições transparentes, onde pela primeira vez se conseguiu evitar que
os mortos votassem, porque na Venezuela tinham o mau hábito de votar. É um
mau hábito... E também se conseguiu evitar que cada pessoa vota-se várias
vezes, por causa da doença de Parkinson, muita gente colocava vários votos nas
urnas.
A Venezuela
é um país estranho onde isto acontece, e ao mesmo tempo se assiste às denúncias
pela falta de liberdade de expressão."
4 comentários:
Grande Eduardo Galeano! Lindas palavras vindas de um mestre.
Excelente post Mario, o sempre Eduardo Galeano, é bem isso mesmo, mijam na gente e a imprensa fala que é chuva. E o que o povo faz? Abre o guarda-chuva.
Um grande abraço meu amigo
Mário acho bastante apropriado e simples o ponto de vista do Galeano, não lio estatutos da ONU, mas acredito que ninguém é obrigado a se associar a esta empresa, hipoteticamente se todos os países que a compõem e que não têm direito a nada, exceto de participar como figurante deixassem de ser associados, sei que seria utópico, mas para quem a ONU iria legislar?
Abraços
olá Mário: parabéns por divulgar o pensamento de Galeano. É alguém, que falando da América latina, alcança o mundo, alcança neste momento a Europa dos gregos, portugueses, espanhóis, italianos... porque possui uma sensibilidade universal. Acho que experiências do Equador, Argentina (ouvi dizer de gregos com bandeiras argentinas em protestos de rua)e Brasil recentes, reagindo ao neoliberalismo e à expropriação da soberania nacional poderiam ser mencionados, até porque nós povos latino americanos carregamos nos ombros uma tradição centenária de exploração e desrespeito, vocês não, ou bem menos, ou de outras formas.
Penso que, se vocês seriam muito mais capazes e decididos do que nós de praticar a conveniente desobediência civil nesse momento, nós somos capazes de tirar forças de onde não se imagina que pudessem ainda existir para resistir ao infortúnio e à miséria.
Abraços
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