sábado, março 24, 2012

Golpes e contra-golpes na China



Uma cortina de silêncio abateu-se estranhamente sobre o Império do Meio, há rumores de militares com tanques de novo nas ruas de Pequim, tiros, carros de polícia, prisões e detenções. Certo, certo é que oficialmente nada se sabe, nada transparece, a informação é controlada ferreamente.
A destituição de Bo Xilai, presidente do governo da cidade autónoma de Chongqing e líder do Partido Comunista Chinês (PCC) local, colocou Pequim no centro de rumores de um golpe de Estado que os correspondentes da imprensa ocidental não confirmam, mas que nem por isso fazem parar.
O facto de a imprensa oficial chinesa pouco se ter referido ao tema, tirando uma declaração de uma linha que dava conta da destituição de Bo – a mais importante purga das últimas décadas – na sexta-feira, forneceu o ambiente perfeito para a multiplicação dos rumores.
Um dos boatos, que se espalhou como fogo em capim, surgiu na segunda-feira à noite, segundo o jornalista do “Financial Times”. Um golpe militar liderado por Zhou Yongkang, próximo de Bo Xilai e chefe dos serviços de segurança do Estado, estava a acontecer e ouviam-se trocas de tiros em Zhongnanhai, o complexo onde residem os principais líderes do país. Jamil Anderlini, o correspondente do jornal, passou pelo local nessa mesma noite e não viu indícios de qualquer acontecimento extraordinário.
O mesmo escreve Damian Grammaticas, correspondente da BBC na capital chinesa: “Ok, antes de começarem a ficar demasiado agitados, não há nenhum golpe. Para ser mais exacto, tanto quanto sabemos não há nenhuma tentativa de golpe.”
Só que isso é a imprensa ocidental. Os chineses habituaram-se à internet, aos blogues, aos microblogues, às redes sociais, a tudo o que lhes permita ultrapassar a mão-de-ferro com que o governo controla a imprensa. E esse é um campo minado para a veracidade. Ficções, mentiras, mitos, tudo se conjuga numa amálgama caótica na qual é difícil destrinçar se há algo parecido com factos.
Há fotografias de tanques e blindados nas ruas que são de arquivo e muitas nem sequer são de Pequim, apesar de pretenderem demonstrar que há mesmo um golpe de Estado em curso.
Mesmo assim, uma fonte próxima dos serviços de segurança do Estado disse ao “Financial Times” que Zhou Yongkang está “sob algum tipo de controlo” e foi-lhe pedido que evite as intervenções públicas e não participe em quaisquer reuniões de alto nível.
Christina Larson, especialista em China da revista “Foreign Policy”, lembrava ontem no blogue dos directores da FP que esta multiplicação de rumores na internet surge numa altura em que o governo apresentou planos para reforçar os controlos e exigir o registo com nome próprio no site de microblogues Weibo, o equivalente chinês do Twitter – exactamente numa tentativa de controlar os fluxos de informação, tal como acontece com a imprensa oficial.
No entanto, habituadas ao secretismo e ao controlo dos media, as autoridades chinesas lidam pior quando se trata de tentar controlar as informações que vão circulando pela internet. Usar uma única linha para explicar o afastamento de Bo Xilai, um político popular que estava na calha para ascender ao Comité Permanente do Politburo do PCC em Outubro (ver texto ao lado), o núcleo de nove pessoas que gere efectivamente o país, é um convite à especulação.
A mesma fonte citada pelo “Financial Times” refere que Bo está sob prisão domiciliária, enquanto a mulher foi levada para interrogatório por suspeita de corrupção, crime de que habitualmente são acusados os líderes do país caídos em desgraça.
As histórias que se contam em relação à queda de Bo Xilai prendem-se com a tentativa do ex-presidente do governo de Chongqing de abafar uma investigação de corrupção à sua família. Bo terá pressionado o vice-presidente e chefe da polícia da cidade, Wang Lijun, e este acabou a tentar pedir asilo político no consulado dos Estados Unidos em Chengdu. Negado o pedido, Wang foi levado pelos serviços de segurança do Estado, adianta a BBC.
Visto como um neo-maoista, defensor de uma maior redistribuição da riqueza proveniente do crescimento económico da China e de um regresso a alguns dos valores da Revolução Cultural, Bo Xilai era o principal rosto de um dos modelos apontados para o desenvolvimento do país. E terá perdido a luta. “Bo é a mais dramática manifestação da contestação interna. É por essa razão que tinha de desaparecer. Isto apesar de ser o ‘príncipe’ herdeiro de um dos oito imortais da geração revolucionária de Mao”, Bo Yibo, diz David Pilling no “Financial Times”.

2 comentários:

Um novo Despertar disse...

Olá Mário.
Mesmo assim o mistério sobre o que de fato ocorre dentro da China continua um mistério insondável.
As evidências em contrário por parte de midiáticos ocidentais seguem a uma linha de não se criar informações que tragam um mal estar por parte de onde se partem as fontes ocidentais que diriam se tratar de uma tentativa de golpe-contra golpe ou golpe. Não houve golpe no que vemos oficialmente, mas que há uma ebulição interna dentro das estruturas do PCC isto não podemos negar.
E a China com seu árduo control de informações, e bem que estas se mesclam a muitas verdades e mentiras, vai procurar passar ao exterior uma unidade inabalável enquanto sufoca as resiliências internas.
Só saberemos e olha olha se há um golpe militar em curso na China,quase que no dia de São nunca.Risos
É muito control para um país,e que trabalho hercúleo do governo chinês em abafar tudo. E claro enfim, que a imprensa ocidental não vai querer causar um desconforto ao noticiar algo que a China jamais vai querer demostrar, desunião interna perante ao mundo.
A China sabe até piratear o golpe.Risos
Abraços amigo Mário.
Sucesso

Mário Nunes disse...

Seis pessoas foram detidas, 16 portais da Internet foram fechados e duas das maiores redes sociais da China proibiram temporariamente a publicação de comentários depois de terem circulado rumores de um golpe de estado, informou hoje a imprensa oficial.

A operação, anunciada de madrugada, também incluiu "reprimendas e educação" de outras pessoas que participaram na divulgação dos rumores, indicou o Departamento Estatal de Informação na Internet da China, responsável por controlar os conteúdos na rede chinesa.

Estes rumores "causaram uma péssima influência junto do público", assinalou o Departamento, responsável pela censura num país que, apesar do rígido controlo de conteúdos, detém a maior comunidade de internautas do mundo (513 milhões).

Na semana passada, informações sobre disparos na Praça de Tiananmen ou veículos militares a entrarem em Pequim circularam nas redes sociais chinesas, ao ponto de meios de comunicação do exterior terem investigado a possibilidade de um golpe de Estado, num momento em que se assiste a uma forte tensão no seio do regime devido às mudanças na estrutura do poder, a ter lugar em outubro.

A par da operação, o "Diário do Povo", voz oficial do Partido Comunista chinês, publica hoje um editorial advertindo que a difusão de rumores na Internet será gravemente punida pela lei.

O microblog QQ e o Sina Weibo - o mais popular serviço deste tipo na China (onde o Twitter está bloqueado)- anunciaram a suspensão da função de comentários desde hoje até ao próximo dia 03 de abril para "limpar de rumores" as duas redes sociais.
Esta é uma das operações mais drásticas do Governo chinês contra a difusão de conteúdos "sensíveis" na Internet e uma mostra da tensão no seio do regime que recentemente também viu ser destituído um dos seus políticos em grande ascensão, o ex-ministro do Comércio e secretário-geral do Partido Comunista em Chongqing (sudoeste do país), Bo Xilai.

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